terça-feira, 13 de novembro de 2012

G1 - Santos e Região


Fandango e dança do coco movimentam a cultura caiçara

Principal instrumento da cultura é a rabeca, que é passada por gerações.
Já as danças de origem afro-brasileiras são as mais comuns em Cananéia.


Mariane RossiDo G1 Santos
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Fandango caiçara é o estilo musical predominante nas festas da cidade (Foto: Mariane Rossi/G1)Fandango caiçara é o estilo musical predominante nas festas da cidade (Foto: Mariane Rossi/G1)









A cultura dos primeiros habitantes da Ilha de Cananéia dão o tom da música e da dança que agitam a cidade em pleno século 21. A origem é perceptível desde a madeira caxeta que dá formato a rabeca, até a dança do coco que veio junto com os africanos, mas se consolidou no Brasil com uma pitada do suingue brasileiro.
O cotidiano caiçara, o estilo de vida dessas pessoas, a rotina no campo e no litoral é contada no fandango caiçara, um ritmo musical que é característico de quem vive entre o sul do Paraná e o norte do Rio de Janeiro. Em Cananéia, a última cidade do litoral sul do Estado de São Paulo, esse estilo musical é predominante nas festas da cidade.
Os fandangueiros, como são chamados os integrantes de um grupo de fandango caiçara, utilizam diversos instrumentos. Segundo o músico Rodolfo Vidal, que faz parte do grupo de fandango Terra Firme, normalmente o grupo é formado por cinco ou seis pessoas e são utilizadas duas violas, uma rabeca, um pandeiro ou adufo e uma caixa de folia. “Da rabeca se formou o violino. A viola fandangueira, ou também viola branca, recebe esse nome porque ela é feita de caxeta, uma madeira branca e leve. Ela tem um som diferente”, explica.
Vidal diz que há vários tipos de fandangos no Brasil, por causa das diferenças culturais. “A gente acredita que essa festa chegou com os portugueses e ganhou uma cara do caiçara com a cultura daqui”, diz. Em Cananéia, é usada uma estrutura chamada de ‘periquita’, que é uma corda adicional ao tampo da viola e que também modifica o som. Além disso, a viola tem sete cordas e uma afinação própria, diferentemente da viola caipira e das encontradas nas cidades de Paranaguá (PR) e Iguape (SP). Os instrumentos são produzidos em casas artesanais da própria cidade.
O fandango batido é normalmente dançado por casais. Ele tem origem na época da colonização do Brasil. Na dança, os casais expressavam o trabalho que era feito nas plantações de arroz. Os homens colocam tamancos e as mulheres vestem saias. O homem bate os tamancos no chão como se estivesse esfarelando o arroz e as mulheres utilizam as saias para abanar o farelo que saia do grão. Algumas comunidades ainda resgatam essa tradição, mas isso é pouco visto no litoral de São Paulo, apenas em festas típicas.
As modas, toadas ou versos, fazem parte dos estilos de composições do fandango. Vidal explica que há muitos compositores em Cananéia, mas ainda são as letras mais antigas que fazem mais sucesso. Um dos motivos é que o fandango é passado por diversas gerações. Os chamados ‘mestres’, pessoas mais experientes, tem a missão de ensinar os novos fandangueiros a arte deste ritmo e são responsáveis por não deixar a cultura morrer. “Os mestres são pessoas detentoras de todo o conhecimento do fandango caiçara. É um bem imaterial, que realmente a gente não consegue pegar, mas a gente consegue aprender. É muito mais interessante ir na casa de um mestre e pedir informação para ele. Leva muito tempo para se tornar um mestre, precisa ser muito experiente e precisa do reconhecimento da comunidade”, explica o músico.
Para ele, o fandango caiçara sempre foi forte em Cananéia e, agora, com a aparição de mais músicos e mais tocadores, o ritmo se tornou comum na cidade. “Acho que o fandango está presente em todos os bairros”, diz Vidal, que pretende perpetuar o ritmo e a cultura local caiçara por muitos anos por meio do grupo de fandango formado pelos jovens Celsinho, Heitor Cardoso e Doca, que foi formado em 2011 e que já tem apresentações marcadas em outras cidades do país.
Grupo de Cananéia, SP, também faz apresentações em outros lugares do Brasil (Foto: Mariane Rossi/G1)Grupo de Cananéia, SP, também faz apresentações
em outras cidades (Foto: Mariane Rossi/G1)
Outras manifestações
As manifestações populares de origem afro-brasileira também são muito vistas em Cananéia. A capoeira, o samba de roda e a dança do coco, que foi criada em Alagoas, lembram a vida nas senzalas. Cleber Rocha Chiquinho, de 32 anos, instrutor de capoeira e que também insere esses tipos de manifestações em Cananéia, conta a história da dança do coco. “O coco tem muito a ver com as quebradeiras de coco. Elas quebravam o coco e tinha a batida do coco. Para fazer as casas, para fazer o chão batido, as pessoas faziam uma noite de coco para o chão assentar. Isso mais para a região nordeste, onde tem essa cultura”, explica ele.
Segundo Chiquinho, essa cultura das comunidades negras foi trazida para a região porque há muitas evidências que retratam os negros na cidade. ”Além de ser uma das regiões mais antigas do Brasil, nós temos uma diversidade cultural muito grande, onde os negros estão muito presentes também. Em Cananéia, a gente tem vários remanescentes de quilombo. O Vale do Ribeira é uma região onde tem a maior concentração de quilombos por metro quadrado no Estado de São Paulo”, afirma.
Em um ritmo acelerado, que se assemelha a batida de cocos, as pessoas dançam em rodas, em fileiras ou círculos. Elas também cantam junto com os músicos enquanto dançam. As mulheres geralmente usam saias e os homens chapéus de palha. Há também a troca de pares a todo o momento. Em Cananéia, a maioria dança descalço, já que é preciso marcar bem cada passo, como se realmente estivesse pisando em um coco. “É um jogo de olhar, jogo de sedução. É até bom. Quanto mais diversidade de faixa de idades melhor”, diz o instrutor.
Há apresentações da dança em diversos eventos da região. Chiquinho faz parte do grupo que, além da dança do coco, faz apresentação de puxada de rede, de maculelê com pirofagia, samba de roda, entre outros ritmos africanos. No grupo há em torno de 40 pessoas, entre crianças e adultos. Eles estudam as danças e músicas relacionadas ao coco e tentam inovar a cada ano, expandir e passar essa cultura adiante. “Isso acontece porque está na raíz da história do Brasil. A gente acaba consumindo muita coisa que vem de fora e perdemos muito disso. Um dos trabalhos nossos é tentar levar isso para dentro das escolas. Colocamos a molecadinha para dançar o coco para que eles aprendam logo cedo e carreguem essa cultura, todo esse conhecimento ao longo da vida”, finaliza.
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